Florisval Meinão*
Dias atrás, no Congresso Paulista e Brasileiro de Política Médica na Associação Paulista de Medicina, lideranças das entidades médicas, autoridades políticas e gestores do setor traçaram um raio-X da saúde pública no Brasil. Chegou-se ao parecer unânime de que, em mais de vinte anos de existência do Sistema Único de Saúde (SUS), os problemas de acesso permanecem recorrentes, penalizando pacientes e particularmente as camadas mais vulneráveis da população com filas intermináveis, falta de profissionais e de medicamentos, com uma estrutura sucateada, dificuldade de marcação de consultas, entre outros.
O SUS, teoricamente, é ainda o mais avançado programa mundial para assistência universal e integral em saúde. Na prática, contudo, as deficiências se arrastam, tendo ligação direta com o subfinanciamento público. A iniciativa privada investe na área mais recursos do que o Estado. O setor recebe 8,4% do chamado produto interno bruto (PIB), Deste montante, 55% são privados (e beneficiam cerca de 46 milhões de pessoas) e 45%, públicos – para as demandas de todos os 200 milhões de brasileiros.
A fatia estatal representa 3,7% do PIB, um terço mais baixo do que a média internacional, de 5,5% do PIB, de acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS). Na América Latina, só investimos mais do que Venezuela, Paraguai e Equador.
O Governo Federal progressivamente reduz seu investimento, enquanto estados e municípios aumentam. Houve época em que a União chegava a destinar 80% dos recursos públicos para a saúde e hoje aplica apenas 45%. Um complicador é que nem o parco orçamento da Federação é executado. Em 2012, o Ministério da Saúde não utilizou o montante de R$ 9,01 bilhões dos recursos previamente destinados à assistência, a despeito de todas as carências da rede de atendimento.
Na última década, também se deu movimento contraditório na arrecadação da carga tributária. A Federação concentra cada vez mais os impostos, o que, evidentemente, diminui o orçamento de Estados e Municípios. Assim, mesmo ampliando proporcionalmente suas destinações em saúde, Estados e Municípios não conseguem atingir os patamares ideais.
No Governo Federal, os ditames da área econômica prevalecem, o que amplia o déficit no campo social. Foi assim que o Senado Federal abdicou em meados de 2011 da oportunidade histórica de aumentar os investimentos em saúde. Os parlamentares optaram por regulamentar a Emenda Constitucional 29, via substitutivo ao projeto original do próprio Senado, o PLP 306/2008, que frustrou o anseio de médicos, de demais agentes de saúde e da sociedade civil. Apenas na oportunidade, deixamos de injetar na reestruturação do SUS cerca de R$ 45 bilhões. O projeto de lei de iniciativa popular idealizado pela AMB juntamente com a OAB resgata a proposta inicial de 10% de investimento da receita bruta da união. Porém manobras parlamentares dificultam sua tramitação, além de tentar descaracterizá-lo, frustrando os milhões de brasileiros que os subscreveram.
Falta dinheiro para a saúde, é verdade, mas a gestão também deixa a desejar. Recente relatório do Banco Mundial destaca que é possível promover melhorias com administrações mais comprometidas e competentes. Entre os maus exemplos citados no documento estão a baixa eficiência da rede hospitalar, a rotatividade dos leitos, a fragilidade do programa de saúde da família.
Mesmo diante de tal quadro, é ainda consenso que o SUS representa um grande avanço no processo de inclusão social. Melhoramos os indicadores de saúde, principalmente índices de mortalidade infantil e o aumento da longevidade, só para citar alguns. Entretanto, o sistema mantém debilidades crônicas, em particular quanto ao acesso e à resolubilidade.
Diante deste cenário de insuficiência de recursos e ausência de vontade política de nossos governantes, considerando ser um ano eleitoral no qual serão escolhidos governantes e parlamentares em diferentes níveis, as entidades médicas se propõem a aprofundar este debate com a sociedade, com propostas concretas que apontem no caminho da melhoria da qualidade de assistência à saúde em nosso país.
* Florisval Meinão é presidente da Associação Paulista de Medicina
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